quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Querido 2021, seja bem-vindo!

 Querido 2021, seja bem-vindo!

Entre, a casa é sua.

Se não for pedir demais, nos devolva, por favor, todos os abraços que seu prezado antecessor nos roubou. Queremos também as gargalhadas dos parentes e amigos, o livre sorriso dos desconhecidos, a brisa no rosto. Gostaríamos ainda de ter de volta a alegria das viagens; a tumultuosa euforia dos estádios e dos grandes shows; todas as tardes em que não fomos beber cerveja com os amigos no boteco da esquina.

Não se esqueça de nos devolver aqueles jantares intermináveis, em que discutíamos o fim do mundo e como iríamos recomeçá-lo. Hoje, que sabemos muito mais sobre o fim do mundo, essas conversas antigas me parecem todas um tanto ou quanto ingênuas. Contudo, mais do que antes, é importante conversar sobre recomeços. Trocar sonhos. Debater utopias.

Eu, que não sou de futebol nem de carnaval, agora sinto ânsias de me perder entre multidões, gritando, sambando, abraçando, me descobrindo nos outros. Quero dançar sem culpa. Quero poder voltar a abraçar meus velhos pais sem medo de os contaminar.

A maior invenção da Humanidade não foi a roda nem o fogo. Não foi o futebol, a feijoada, o samba, o xadrez, a literatura, sequer a internet. A maior invenção da Humanidade, querido 2021, foi o abraço. Olho para trás e vejo a primeira mãe, acolhendo nos braços o filho pequeno. O nosso pai primordial apertando contra o peito forte (e peludo) a mulher amada; dois amigos se consolando numa armadura de afeto. Depois desses primeiros abraços, alguma coisa mudou para sempre. O mundo continuou perigoso, sim, o mundo será sempre perigoso, mas passamos a ter o conforto de um território inviolável. Foi o abraço que fundou a civilização.

Com elevada estima,

*José Eduardo Agualusa Alves da Cunha (jornalista, escritor e editor)

sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Em férias no meio da pandemia

Este será um fim de ano, com suas costumeiras festividades, bem diferente para cada um de nós. Para as crianças e jovens, então, nem se fala! Em primeiro lugar, a criançada nem pode comemorar a chegada das férias, sinônimo para eles de ficar mais tempo em casa com os pais, de viajar, de fazer programas com a família toda, de brincar com amigos e colegas e de ficar livre das aulas, dos estudos obrigatórios e de todos os compromissos e horários resultantes da vida escolar.

Férias estranhas, essas: quase não frequentaram a escola o ano todo e muitos tiveram aulas e estudos dirigidos remotamente, o que foi, vamos reconhecer, um auê, principalmente para as crianças menores. O que era, até então um brinquedo - os aparelhos tecnológicos - passou a ter de ser encarado como instrumento de estudo.

A pandemia tirou muita coisa das crianças e, nas férias delas, resolveu trabalhar com mais afinco ainda. Precisamos ver o que é passível de reparação para elas nessa história, pelo bem da saúde mental da família toda, certo?

É possível tentar mudar alguma coisa no cotidiano delas? Essa é uma boa pergunta a ser feita pelos pais. Afinal, férias tinham o sabor de mudança de organização dos dias, não é? Então, uma boa pode ser introduzir, a cada dia, uma pequena mudança. Sim, eu sei que os pais estão exaustos e esgotados, mas criança entretida e alegre dá menos trabalho, lembre-se disso.

Outra dica é organizar atividades que eles nunca fizeram antes, ou que fizeram poucas vezes. Criança adora novidade e surpresas. Os pais precisam saber antecipadamente que nem toda surpresa é bem recebida por eles, mas esse fato já é, por si só, uma boa lição para pais e filhos. Para os pais, é uma deixa para que conheçam melhor os filhos. Para estes, que aprendam a se entregar ao que a vida pode oferecer no momento. Uma boa lição para se aprender na infância, já que muitos adultos não conseguem fazer isso.

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Atenção: quanto mais nossas crianças e jovens frequentam o mundo virtual, maiores são nossas responsabilidades.



Atenção: quanto mais nossas crianças e jovens frequentam o mundo virtual, maiores são nossas responsabilidades. Por quê? Muitas crianças, a partir de 8 anos, já frequentam algumas redes sociais, e nem sempre com a tutela dos pais. E elas nem poderiam estar lá porque, como sabemos, é a partir dos 13 anos que qualquer rede social aceita a adesão dos internautas. O problema maior é que parte dessas crianças enganou a idade quando da inscrição, com o consentimento dos pais!

Estes, costumam justificar sua atitude dizendo que os filhos nasceram no mundo “50% virtual, 50% real” e que, por isso, eles não conseguem ficar excluídos das redes. E como as crianças sabem muito bem ser insistentes e usar argumentos que seduzem os pais, como por exemplo o conhecido “todos os meus colegas têm página lá”, acabam convencendo-os de que participar de uma rede social é algo tranquilo. Não é.

Vale a pena relembrar alguns aspectos importantes a respeito de crianças e de adolescentes até os 16 anos, mais ou menos. Como seres em formação, eles ainda não têm recursos pessoais desenvolvidos, o que os deixa frágeis e vulneráveis frente às adversidades da vida. É por isso que eles precisam dos adultos: para que cuidem deles porque ainda não sabem se cuidar.

Nessa idade, ainda estão em formação a sua identidade, diversos aspectos da personalidade, o autoconhecimento e o processo da conquista da autonomia, entre outros. Ah! Ainda que tenhamos nos desacostumado com a existência do autocontrole, de tanto testemunharmos adultos descontrolados nos espaços públicos e nos noticiários, as crianças e adolescentes ainda precisam de um tempo para alcançar a maturidade e, consequentemente, o autocontrole. E viver sem isso é prejudicial, pessoal e socialmente.

Considerando isso, vamos pensar nas crianças e adolescentes nas redes. Primeiramente, muitas delas sofrem assédio e nem sabem identificar isso porque não conhecem o fenômeno, não foram orientadas. Elas apenas sofrem com as consequências dessas vivências: a autoimagem fica danificada, emoções fortes como a tristeza, a ansiedade e a angústia, por exemplo, as assaltam, podem desenvolver distúrbios alimentares, do sono, muitas se isolam etc. Em resumo: a saúde dessas crianças e jovens em todos os seus planos – físico, mental e social –, pode ser prejudicada.

É inegável que o uso da internet traz muitos benefícios a eles, mas prejuízos também, justamente pelo fato de ainda não terem desenvolvido os recursos pessoais que possibilitam proteção para se defender de ataques e assédios. Mais uma vez: é por isso que precisam de nós, adultos, tutelando seu acesso à internet. E tutelar é justamente isso: defender e proteger quem está sob sua responsabilidade, certo?

Antes de as escolas fecharem por causa da pandemia, a maioria dos pais se preocupava com o tempo de dedicação dos filhos ao mundo virtual. Nunca existiu nem existirá um tempo cronológico adequado porque as crianças são diferentes, vivem em ritmos diferentes; o importante era não permitir o exagero, ou seja, mais horas no mundo virtual do que em outras atividades.

Mas agora é preciso redobrar a atenção porque não basta limitar o tempo na internet: é preciso cuidar do que eles fazem nas redes. Sua filha ou seu filho sai do local virtual em que estava assim que você se aproxima? Sinal de alerta!

Se não dá para ficar perto deles o tempo todo, lembre-se de que eles podem usar a internet no celular ou tablet com a imagem espelhada no aparelho de televisão. Dessa maneira, você tem mais facilidade para saber o que ele está fazendo, mesmo estando mais distante dele.

Eles precisam saber que você irá tomar os cuidados necessários para protegê-los no uso da internet. Nada de olhar o celular escondido: diga claramente que é sua responsabilidade fazer isso regularmente.

domingo, 4 de outubro de 2020

TODO PROCESSO DE ADAPTAÇÃO ESCOLAR PRECISA DE PLANEJAMENTO!

Todo início de ano letivo, os pais que levam os filhos pela primeira vez à escola, ou aqueles que transferiram seu filho para uma outra escola, se acostumam com uma palavra que será repetida muitas vezes: adaptação. Primeiramente, o aluno precisa se apropriar do ambiente físico. Depois, muitos pensam que os alunos precisam apenas se adaptar aos professores e aos colegas. Não: todos os trabalhadores da escola precisam ser conhecidos por nome. Nada de “tia da limpeza”. Claro que demorará um tempo, mas isso faz parte do processo de humanização dos relacionamentos interpessoais, que colabora para instaurar o respeito entre todos. Chega, então, o tempo de conhecer os princípios da escola, sua organização e seu funcionamento. Com o desenvolvimento de todas essas aprendizagens, os mais novos começam a entender o que significa ser aluno naquela escola.

Sabemos que crianças e adolescentes têm maior facilidade do que adultos para se adaptar a mudanças: para tanto, basta que sejam acolhidos em sua insegurança inicial e acompanhados em seus passos para o necessário encorajamento e tutela, é claro.


Por outro lado, eles também podem oferecer maior resistência sempre que iniciam a mudança. Acordar, deixar de jogar, trocar-se, tomar banho, ir para a escola, por exemplo, são atividades que pedem rituais de transição para facilitar a passagem e vencer as resistências. Depois de tanto tempo em casa, sem ir para a escola, os mais novos vão precisar de um período de adaptação, tanto em casa quanto no colégio. Por isso, famílias e escolas precisam se preparar. E não se engane: mesmo os que estão implorando para a volta às aulas precisarão dessa adaptação. É que o retorno na imaginação deles é uma coisa, e a realidade será bem diferente.

Em casa, volta a valer com maior rigor o cumprimento de horários, e sabemos o quanto isso é difícil para as crianças, por um motivo simples: o tempo, para eles, é o experiencial e não o do relógio, não é verdade? De nada adianta dizer a uma criança, por exemplo: “Você só tem 10 minutos para colocar o uniforme!”. Se o tempo é pequeno, o adulto precisa acompanhar o processo com a criança. Organizar o material escolar, o uniforme ou a vestimenta que usará, acordar em tempo para um café com companhia são exemplos de rituais que ajudam a criança a se despedir de casa, da família, e ficar pronta para sair de lá.

A escola é o lugar certo para eles aprenderem isso. E é bom saber que não se trata apenas de obedecer a regras. Aprenderão o princípio do cuidado com a própria saúde e com a dos outros, o que dá noção de responsabilidade! E todo processo de adaptação escolar precisa de planejamento!

segunda-feira, 14 de setembro de 2020

ESCOLA E PANDEMIA

 As crianças perderam a pouca mobilidade que tinham: ir à escola, conviver com as pessoas de lá, ir a parques ou clubes, receber colegas e amigos em casa, frequentar a casa deles, fazer passeios com a família. Tantas restrições trouxeram, para muitas delas, mudanças de comportamento. Era de se esperar, não é verdade?

Mães e pais já perceberam os filhos com dificuldades de se concentrar nas aulas remotas, mais irritados e briguentos, tristes, com problemas para dormir e se alimentar. Todas essas reações merecem atenção, o que tem sido difícil para muitos pais pela própria situação de tensão e estresse em que também vivem. Mas um esforço adicional é necessário, as consequências negativas desse período dos mais novos podem repercutir até em sua vida adulta.

Se os filhos não estão bem, a volta às aulas presenciais no espaço escolar pode não funcionar como uma solução para eles. Conhecer o filho é fundamental nesse momento, portanto. Para algumas crianças fará muito bem, para outras nem tanto, principalmente por um motivo: elas esperam a escola como a conheciam, e encontrarão outra realidade. 

Os horários preferidos dos alunos, na escola, são o de entrada, recreio ou saída: é quando encontram os colegas, brincam, se aglomeram. E estará tudo diferente: número de colegas reduzido, horários alternados, muita tutela adulta. Frustradas, algumas podem reagir mal. E, além da compreensão e acolhimento dos pais quanto ao seu sofrimento psíquico, as crianças e os adolescentes podem precisar de atendimento especializado. No caso, uma busca simples na internet lhe trará muitas indicações, inclusive gratuitas. 

Na hora de se tomar a decisão - retornar ou não à escola -, uma conversa em família pode ser de grande valia para ouvir e comentar as expectativas e os receios. 

Mas é bom lembrar: ouvir os filhos é fundamental, mas a decisão é dos adultos responsáveis. Não podemos deixar o peso de uma decisão tão complexa sobre os mais novos. Se a decisão for pelo retorno, cabe então uma visita à escola, se possível, para verificar as instalações, e um “intensivão” sobre as atitudes que os alunos terão de ter na escola. Não, não será fácil nem tranquilo para todos nós, mas é uma decisão que precisará ser tomada pela família, pela escola e pelos governos. 

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

PRECISAMOS ESTAR ATENTOS À SAÚDE MENTAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES AGORA.

Olhe para seu filho que, no momento, passa a maior parte do tempo em casa, já que a maioria dos Estados não retomou aulas presenciais. Observe como se comporta o corpo dele: a postura que adota em diferentes situações, o equilíbrio ou o desequilíbrio ao se movimentar, a harmonia – ou a falta de – entre os membros, por exemplo, ao caminhar ou correr. O corpo expressa mais do que ocorre com o biológico: comunica, também, ideias, emoções, sentimentos.

Você já deve ter reparado que, ao viver situação de tensão emocional, diversos músculos de seu corpo se tensionam. Aí, chegam as dores e seu corpo sofre de um mal-estar cujas origens não residem nele, não é verdade? Quando você está desanimado, como muita gente está agora, a postura corporal muda, comunicando, sem palavras, seu estado de ânimo. Pois bem: o mesmo ocorre com crianças e adolescentes, que têm na linguagem corporal um importante meio de comunicação, tanto como receptores quanto como emissores.

Uma jovem mãe, que está em casa com os três filhos pequenos, contou que, logo pela manhã, o filho de 5 anos lhe perguntou se ela estava triste. Ela se surpreendeu porque, de fato, estava: passara a noite quase em claro, perturbada com a notícia de que uma amiga estava no hospital com o filho pequeno com sintomas de covid-19. E o seu filho fez a leitura desse sentimento da mãe, provavelmente observando sua expressão facial, a postura de seu corpo, seu olhar e a cadência de sua fala; ele leu a linguagem corporal da mãe. Se ela tivesse negado ao filho a tristeza que sentia naquela manhã – o que não fez –, ele ficaria na incômoda situação de perder um pouco a confiança nela pela contradição percebida.

Nesta época em que os pais estão muito atentos às manifestações do corpo de seus filhos – “será que está febril?”, “apresenta tosse?”, “reclama de dor de cabeça e/ou de cansaço?”, sintomas comuns da covid-19, é importante também procurar fazer a leitura das emoções e sentimentos que o corpo pode expressar. Não é apenas com a saúde física das crianças e dos adolescentes que devemos nos ocupar neste tempo tão estranho para todos nós. A saúde mental deles também está em risco, tanto pela falta de contato com outros adultos e com outras crianças quanto pela percepção que eles têm de que as coisas não estão indo muito bem: há sinais de riscos no ar, que eles captam muito bem nos pais.

Mudanças na linguagem corporal são sinais que podemos observar de que a saúde mental está afetada por ansiedade, tristeza, insegurança, por exemplo. Dou alguns exemplos: agitação motora, corpo com postura abandonada, comportamentos corporais mais agressivos, falta de apetite, perturbações do sono etc. Esses sinais, entretanto, nem sempre exigem abordagem profissional: os pais também podem ajudar. Vamos lembrar que o primeiro contato do bebê com a mãe e o pai é o de pele com pele: é a partir desse contato que se inicia o vínculo entre eles. Dessa forma, massagens suaves e relaxantes, utilizando algum objeto – como bola de tênis, por exemplo, ou um creme neutro -, acompanhadas de palavras igualmente suaves, colaboram bastante para que a ansiedade da criança diminua.

No filme Tully, a personagem tem três filhos, e o do meio não suporta mudanças de rotina e apresenta outros medos que funcionam como gatilhos para as crises que apresenta. A mãe foi orientada a passar no corpo do filho um pincel macio, com o intuito de acalmá-lo, e faz isso sempre que acha que o filho precisa. Em dado momento, o garoto diz à ela que não precisa mais disso porque, mais importante que o pincel, é ela fazer isso com ele. Percebe que a massagem na criança é um mediador da manutenção do vínculo amoroso entre eles?

Em casa, as crianças e os jovens estão bem à vontade, o que nem sempre pode ser bom. Longe do olhar do outro – que não a família –, ele deixa o corpo de qualquer jeito e isso pode prejudicar seu aprendizado, por exemplo, quando tem de estudar ou assiste a aulas remotas. Cuide da postura do corpo de seu filho porque isso influencia seu aproveitamento, sua atenção, sua organização, tanto para realizar atividades quanto a organização interna que demonstra, ou não, equilíbrio. Observe e corrija, se necessário, a maneira de ele se sentar, veja se as costas estão mais para eretas do que curvadas, e, quando ele usar computador, veja se o olhar dele está voltado para o centro da tela, a fim de evitar desarranjos corporais.

segunda-feira, 27 de julho de 2020

VOLTA AS AULAS?

Há famílias que consideram a retomada este ano uma atitude precipitada e os argumentos para contestar a decisão são realistas. Primeiramente, o fato de não termos vacina contra a covid-19 deixa a população sempre em risco, por maiores que sejam os cuidados tomados. Apesar de sabermos que as crianças se infectam menos e, talvez, transmitam menos o vírus, a ida delas à escola e a estada delas lá envolvem um considerável número de pessoas. Há pais que não querem correr tal risco. 

Há também os que afirmam que poucas escolas possuem condições físicas para atender alunos presencialmente: em geral, as salas de aula são fechadas por paredes, com porta e janelas pequenas – quando não com vitrô basculante – que não possibilitam boa ventilação. Ainda levantam o reduzido número de trabalhadores para a higienização frequente dos espaços e ausência de pias suficientes para todos: alunos, educadores e trabalhadores.

Isso sem falar na dificuldade de a instituição escolar lidar com relativo êxito em determinadas situações. Uma mãe refletiu em um grupo de mensagens instantâneas: “A escola mal dá conta de piolho, que se prolifera rapidamente entre os alunos, como vai dar conta do coronavírus?”.

Há famílias favoráveis ao retorno tão logo seja possível, é claro. Os argumentos também são valiosos: a falta que tem feito aos mais novos o relacionamento com colegas e professores, o processo de socialização pública interrompido, a organização do cotidiano um tanto quanto atrapalhada, a tranquilidade dos pais para ir ao trabalho sabendo que os filhos estão em um local confiável para eles e a aprendizagem que, para crianças, depende bastante do vínculo presencial estabelecido com os professores e com a escola.

Bem, mas há como resolver isso? Temos, aqui, uma boa oportunidade para inaugurar uma nova relação entre a escola e a comunidade que a frequenta. Que tal construir uma parceria escola/família de verdade? Nunca tivemos essa chance antes! Mas, como?

Primeiramente, formando uma comissão gestora desse retorno às aulas com a participação de todos os envolvidos: representantes de pais, de docentes, da direção da escola, dos trabalhadores da instituição escolar, dos alunos. Importante é lembrar que o objetivo de integrantes tão diferentes é o mesmo: o retorno às aulas eficiente no processo de ensino/aprendizagem e com a maior segurança possível.

Sim! Como falta pouco mais de dois meses antes da data prevista, essa comissão conseguiria dar conta de debater e chegar a conclusões importantes para aquela comunidade a respeito de muitos pontos envolvidos nesse retorno, que não é algo simples, não.

Do ponto de vista do processo do ensino e da aprendizagem: certamente, este ano letivo não poderá ser considerado como os outros anos pela comunidade, por isso processos já estabelecidos precisarão ser rediscutidos e reconstruídos. Por exemplo: quais os critérios serão usados para as avaliações? Seria justo avaliar a aprendizagem de alunos igualmente já que muitos não conseguiram se adaptar ao ensino remoto? Como identificar questões emocionais decorrentes da existência da pandemia e do período de isolamento físico interferindo na aprendizagem, e como trabalhar, na escola, com essas situações? Quais metodologias e práticas de ensino inovadoras poderiam contribuir para uma retomada exitosa dos estudos por parte dos alunos e como avaliar o sucesso do uso delas na aprendizagem?

Do ponto de vista sanitário: quais locais da escola os alunos poderão usar, quais deverão evitar e quais não terão acesso de modo nenhum? Como serão administrados os períodos mais críticos, como horário de entrada, intervalo ou recreio e saída? Como garantir o distanciamento físico necessário exigido entre os alunos? Como tratar atitudes rebeldes ao uso da máscara? Como e quando a higiene das mãos deverá ser incentivada e/ou exigida? Que atitudes tomar quando um aluno chega à escola adoentado – não importa que tipo de doença?

Do ponto de vista da cooperação entre a escola e as famílias: os grupos de mães em aplicativos de mensagens podem ganhar objetivos mais nobres do que o atuais? Quais e como? Como administrar e resolver os conflitos que irão surgir? Como chegar a consensos em assuntos importantes para todos? Como debater sem ânimos exaltados? Como estabelecer comunicação não violenta? Há mães e/ou pais que poderiam colaborar com uma hora ou mais na semana para que todos os assuntos decididos sejam praticados?

É um caminho novo para a maioria das escolas e das famílias que só conhecem a chamada parceria de modo nada parceiro. É, também, uma grande chance social que temos para começar um trabalho respeitoso e justo dentro das escolas envolvendo todos os seus segmentos, difícil de ser testemunhado até então. Que tal provocar a escola que seu filho frequenta – ou as famílias de seus alunos – com esse desafio? 

quinta-feira, 9 de julho de 2020

AULAS: quais os critérios?

Do ponto de vista do processo do ensino e da aprendizagem: certamente, este ano letivo não poderá ser considerado como os outros anos pela comunidade, por isso processos já estabelecidos precisarão ser rediscutidos e reconstruídos. Por exemplo: quais os critérios serão usados para as avaliações? Seria justo avaliar a aprendizagem de alunos igualmente já que muitos não conseguiram se adaptar ao ensino remoto? Como identificar questões emocionais decorrentes da existência da pandemia e do período de isolamento físico interferindo na aprendizagem, e como trabalhar, na escola, com essas situações? Quais metodologias e práticas de ensino inovadoras poderiam contribuir para uma retomada exitosa dos estudos por parte dos alunos e como avaliar o sucesso do uso delas na aprendizagem?
Do ponto de vista sanitário: quais locais da escola os alunos poderão usar, quais deverão evitar e quais não terão acesso de modo nenhum? Como serão administrados os períodos mais críticos, como horário de entrada, intervalo ou recreio e saída? Como garantir o distanciamento físico necessário exigido entre os alunos? Como tratar atitudes rebeldes ao uso da máscara? Como e quando a higiene das mãos deverá ser incentivada e/ou exigida? Que atitudes tomar quando um aluno chega à escola adoentado – não importa que tipo de doença?
Do ponto de vista da cooperação entre a escola e as famílias: os grupos de mães em aplicativos de mensagens podem ganhar objetivos mais nobres do que o atuais? Quais e como? Como administrar e resolver os conflitos que irão surgir? Como chegar a consensos em assuntos importantes para todos? Como debater sem ânimos exaltados? Como estabelecer comunicação não violenta? Há mães e/ou pais que poderiam colaborar com uma hora ou mais na semana para que todos os assuntos decididos sejam praticados?
É um caminho novo para a maioria das escolas e das famílias que só conhecem a chamada parceria de modo nada parceiro. É, também, uma grande chance social que temos para começar um trabalho respeitoso e justo dentro das escolas envolvendo todos os seus segmentos, difícil de ser testemunhado até então. Que tal provocar a escola que seu filho frequenta – ou as famílias de seus alunos – com esse desafio? 

sexta-feira, 26 de junho de 2020

REPROVAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA

Se, mesmo em situações normais, a reprovação de um aluno só deveria acontecer em casos extraordinários, neste ano, será necessário sermos ainda mais criteriosos. Isso não significa que os estudantes não devam ser avaliados. Identificar as lacunas de aprendizagem será uma das tarefas mais importantes nos processos de retomada. No entanto, se utilizarmos ao fim esses instrumentos apenas para separar quem vai progredir e quem ficará retido, estaremos cometendo uma enorme injustiça com as crianças e jovens que foram privados de suas oportunidades de aprendizagem. 

sábado, 20 de junho de 2020

QUANDO A EPIDEMIA PASSAR, O BRASIL ESTARÁ MAIS TRISTE, MAIS POBRE E CERTAMENTE MAIS DESIGUAL.

Durante a epidemia, o fosso da desigualdade se aprofunda, não só entre quem tem trabalho e quem não tem mas também entre os mais jovens, afetando, provavelmente em boa medida, o seu futuro. Do total dos alunos do ensino básico, os 70% matriculados nas redes públicas estão sem aulas. Enquanto isso, no restrito grupo de escolas de elite da rede privada, crianças e jovens recebem aulas a distância, graças ao acesso privilegiado à internet e a programas de comunicação remota. Não tem erro: quando a epidemia passar, o Brasil estará mais triste, mais pobre e certamente mais desigual.

sexta-feira, 5 de junho de 2020

VIDA ESCOLAR REMOTA

Os alunos têm realizado a famosa educação a distância (EAD)? Não: eles estão tentando aprender com seus professores mediados pela tecnologia. Estes criaram rapidamente meios de manter seus alunos estudando, em geral transformando o ensino presencial em remoto. Não se constrói uma metodologia de educação a distância de um dia para o outro: exige formação específica dos docentes, por exemplo.
A EAD oferece tutores remotos a quem os alunos podem recorrer quando enfrentam dúvidas ou dificuldades em determinados tópicos, realiza trabalhos que ocorrem simultaneamente com alunos e professor em tempo real – a chamada atividade síncrona – e também as atividades assíncronas, ou seja, as que não ocorrem ao mesmo tempo, além de distribuir os conteúdos a serem ensinados em diferentes desenhos de plataformas e ambientes. É muita diferença!
É, então, ensino domiciliar, ou homeschooling, que a criançada está praticando? Também não! No ensino domiciliar, os filhos não são matriculados em escola e, portanto, não há a participação dela nos estudos. Apenas os pais, parentes ou mesmo os profissionais contratados por eles são responsáveis pela aprendizagem das crianças da família.
Esclarecido o fato de que os alunos estão estudando e realizando tarefas escolares numa situação de emergência, ou seja, muitas vezes com oferta de trabalhos improvisados, o que as famílias podem fazer para ajudar os filhos?
Como manter o filho atento às videoaulas, que podem ter duração de mais de uma hora? Como obrigar o filho a ficar conectado nas atividades escolares? Como ajudar nas tarefas?
Muitas famílias estão perdidas nessa situação; escolas também, já que nem sempre elas se lembram que não dá para oferecer o mesmo ensino anteriormente planejado e cobrar a mesma aprendizagem dos alunos.
Há alunos do ensino médio tendo até 9 horas de aulas por dia; crianças de 3 (3!) anos tendo aulas expositivas pelo menos uma vez por semana e duas, quando têm 5 anos; e crianças de 9 a 12 anos de idade que passam a manhã assistindo às aulas e ainda recebem tarefas de casa.
Calma lá, minha gente! Desse jeito, vamos acabar enlouquecendo famílias e alunos. Dá para lembrar que eles estão estressados, ansiosos, angustiados, inseguros e com receios com a pandemia? A conta de tanto trabalho e de tantas cobranças sobre eles virá depois, sabia?
E, como se não bastasse, há escolas fazendo provas neste período. O que podemos avaliar nesse contexto? O aprendizado do aluno, a adaptação dele ao ensino remoto e às estratégias que a escola criou? Ou será que avaliaremos se a metodologia criada pela escola está adequada? Essa última alternativa é a melhor possibilidade.
As crianças vão aprender como aprendiam antes? Provavelmente, não. Algumas vão aprender em outro ritmo, outras não conseguirão focar a atenção para aprender tudo o que seu potencial permitiria e outras, ainda, resistirão bravamente à ajuda dos pais. Mas – surpresa! –, algumas aprenderão bem mais!
Vamos lembrar: a escola básica tem a duração de 12 anos letivos, minha gente. Alguns meses a menos – dois, três ou até seis – não vão comprometer a vida de nenhum aluno.
Os trabalhos escolares de seu filho estão conturbando a vida familiar e a pessoal dele? Converse com a escola, apresente a situação sem rodar a baiana e peça sugestões. Este é um bom momento para recriarmos em outras bases a parceria escola-famílias.
Seu filho não consegue ficar atento às aulas? Saiba que na escola isso também ocorre, com a diferença de que, lá, há um enquadre pedagógico e, em casa, não. Outras crianças da mesma sala conseguem? Lembre-se que as crianças são diferentes, o que não significa que sejam piores ou melhores na aprendizagem.
Em resumo: não se estresse, nem estresse ainda mais seus filhos com a vida escolar remota.

quarta-feira, 27 de maio de 2020

ESTRESSE E CUIDADO NA PANDEMIA

Como mães e pais podem se proteger e ter o autocuidado em situação tão estressante? Primeiramente, tratando da própria saúde mental. Um passo importante é reconhecer medos, inseguranças, angústia e outras emoções. É normal ter medo, por exemplo, mas quando ele não é reconhecido pode se expressar de outras maneiras e prejudicar o cotidiano. O autoconhecimento facilita o conhecimento das diversas emoções que nos assaltam e, consequentemente, a maneira de lidar com elas. Sentimentos não reconhecidos podem se transformar em um estorvo.
É também o conhecimento de si que possibilita identificar quais atividades podem auxiliar a pessoa a se distrair, relaxar, a reduzir estresse e ansiedade. Pode ser música, dança, meditação, exercícios de respiração, de ioga, jogos de tabuleiros, filmes etc. Aliás, melhor do que brincar com os filhos, o que eles podem e devem fazer sozinhos, é reunir a família na prática de exercícios. Em geral, a garotada curte isso. O que não podemos é exigir deles comportamentos de adultos nessas atividades.
Mas como encontrar tempo para isso se as crianças exigem e demandam a mãe o tempo todo? Elas precisam ser ensinadas a respeitar o tempo de descanso e trabalho dela! Muitas não aprenderam porque era pequeno o tempo para estar com os filhos e, nesse período, os pais atendiam a todos os chamamentos. Agora é a hora desse aprendizado!
Para as crianças, vale muito colocar um indicador visual, pois torna concreta a ideia da espera, de ter de aguardar. Por exemplo: uma mãe colocou um cone de sinalização na porta do cômodo da casa em que trabalha sempre que precisa fazer reunião ou não pode ser interrompida. Para surpresa dela, funcionou!
Ter um tempo para se apaziguar é importante, e recolher as crianças para dormir antes dos pais possibilita isso. Pode dar trabalho? Pode, por alguns dias, no início. Depois, os pais poderão desfrutar momentos de quietude em casa. Cuidar de si é trabalhoso, sim, mas é o que permite que a saúde, física e mental, seja mantida. Por isso, força e coragem!

sábado, 9 de maio de 2020

CONTAR E RECONTAR HISTÓRIAS

As crianças adoram ouvir histórias. Algumas gostam, especialmente, de interagir durante a leitura, fazendo perguntas ou comentários. Isso é ótimo! Sempre aproveite essa disposição natural, para desenvolver habilidades. Nesta aula, exploramos tal interesse, de modo que os alunos participem e discorram sobre o que ouviram.

Recontar histórias auxilia a desenvolver a fala e a escuta, exercita a imaginação, a concentração e a memória, e ainda contribui para a interação entre as crianças. Exige, também, atenção com a sequência dos fatos e com o espaço onde as ações se desenrolam.

Devido à multiplicidade de competências que exercita, a prática pode ser trabalhada com diferentes idades, por meio da audição ou da leitura de textos. Para o primeiro caso, é preciso apenas que a criança saiba falar e tenha algum vocabulário.

A recontagem de histórias é uma ferramenta importante para o professor verificar, de forma muito simples e direta, a compreensão de seus alunos. A depender da profundidade e fidedignidade do reconto, tem-se uma ótima avaliação do nível de compreensão.

Além disso, o exercício fornece aos alunos ferramentas de estudo. Eles se tornarão capazes, por exemplo, de resumir e de extrair detalhes de um texto. Você pode sempre estimular os estudantes, lembrando-os de informações adicionais, caso eles se esqueçam. Faça perguntas objetivas que os auxiliem a recordar as partes importantes. Ao mesmo tempo, dê-lhes liberdade para recontar.

Escolha histórias que despertem o interesse e a curiosidade das crianças. Utilize, também, livros com imagens, as quais poderão ativar a memória visual. Em geral, a atividade é prazerosa para os estudantes, que costumam estar ávidos para compartilhar com o restante da turma o que entenderam.

Esta estratégia pode ser utilizada para verificar, além da compreensão, outra competência importante: o vocabulário. O aluno não dirá necessariamente as mesmas palavras do texto e, assim, demonstrará seu repertório de fala. Por outro lado, repetir os mesmos termos evidenciará assimilação, memória e precisão. Dessa forma, treina-se também a expressão oral adequada, que pode ser avaliada.

Percebe-se, mais uma vez, como os componentes essenciais para a alfabetização estão interligados. As estratégias que os trabalham simultaneamente são muito importantes para uma aprendizagem coerente e efetiva.

AVAMEC

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Talvez tenha chegado a hora de ensinar os processos que envolvem tarefas

Você já assistiu ao filme Feitiço do Tempo? O protagonista, o homem do clima/tempo de um canal de televisão, vai a uma pequena cidade para fazer uma reportagem sobre uma marmota que faz a previsão do tempo, e realiza esse compromisso profissional visivelmente contrariado. O repórter é prepotente, rabugento, mal-humorado, grosseiro e sem compaixão e empatia em seus relacionamentos. Mas aí, ocorre o inesperado: ele acorda todos os dias no mesmo dia em que chegou à cidade e passa pelos mesmos fatos já vividos que o contrariaram tanto. Inicialmente, ele responde ao feitiço tornando suas características ainda mais fortes: passa de grosso a violento, rouba, mente, tenta acabar com a própria vida, mas nada lhe devolve a possibilidade de superar aquele dia. Até que ele escolhe ser melhor do que já fora naquele dia que não termina nunca. Mas, qual a relação do filme com nossas vidas na atualidade?
Para começar, a sensação de muitas mães e pais de que todo santo dia acordamos no mesmo dia. Sabemos os fatos que nos aguardam; só não sabemos como estará a dinâmica familiar com mudanças de humores de seus integrantes. Vamos pensar em como usar esses dias parecidos, mas não iguais, em favor dos mais novos? Podemos começar com a tão falada autonomia.
Para começo de conversa, não vamos confundir a capacidade de crianças e adolescentes de realizar tarefas sozinhos: isso não é autonomia. Autonomia seria, mais ou menos, a conquista da capacidade de planejar e realizar por conta própria o necessário para permitir que a vida caminhe da melhor forma possível. E como estamos todos interligados – e a pandemia nos mostrou isso – não teremos nunca autonomia completa e absoluta.
Utilizei acima a palavra conquista para que os pais não fiquem com a ideia de que eles precisam dar autonomia aos filhos. São os mais novos que precisam conquistá-la, ou seja, precisam mostrar que já são capazes de se organizar em determinadas situações e se responsabilizar por elas. Quando o filho adolescente deve ter autonomia para viajar só com colegas? Somente após cumprir, mais de uma vez, horários previamente combinados com os pais quando sair na cidade em que mora, quando se mostrar responsável com o uso – ou o não – de bebidas alcoólicas nas festas, quando aceitar a incumbência de atender ao celular sempre que os pais o chamarem. Percebem que, nesse caso, o jovem pode conquistar sua autonomia, e não ganhá-la?
Agora é uma boa hora para dar aos filhos a oportunidade de eles conquistarem autonomia em casa, não é? Principalmente porque a maioria dos pais, independentemente de classe social, sequestraram as melhores possibilidades de os filhos avançarem, na prática, nos processos de autonomia. Por quê?
Porque escolhemos fazer por eles muito daquilo que eles já poderiam – e deveriam – fazer por conta própria. Considerando o processo de desenvolvimento dos mais novos, tudo o que eles já podem fazer sozinhos e alguém faz por eles, acaba por atrapalhar seu crescimento.
Talvez tenha chegado a hora de ensinar a eles os processos que envolvem atividades ou tarefas. Tomar banho, por exemplo, é mais do que tirar a roupa e ir para debaixo do chuveiro: envolve separar a roupa que será vestida após o banho, colocar a roupa usada no local adequado para ser lavada, limpar o banheiro, colocar toalha para secar. 
Quando sugerimos a uma mãe que leve o filho pra cozinha, invariavelmente dizem: “Nem pensar, deixam a cozinha muito suja.”. Mas limpar faz parte do processo de ir para a cozinha! Temos lembrado desses detalhes preciosos que mostram ao filho que realizar uma atividade agrega uma série de tarefas no conjunto? Que tal aproveitar esse feitiço do tempo em que nos vemos para investir nesses ensinamentos? 

sábado, 11 de abril de 2020

Compaixão e sensibilidade para se colocar no lugar do outro são fundamentais

Crianças e adolescentes estão confinados há duas semanas. Sem colegas, sem poder brincar em outros locais, sem a possibilidade de sair com amigos para festas, viajar, eles estão, agora, mais do que confinados: estão isolados de seus relacionamentos regulares.
No início, com o fechamento das escolas, parte das crianças e adolescentes comemorou. Difícil para eles não identificar esse período com férias. Nos primeiros dias, muitas famílias entraram quase que em estado de hiperatividade com as crianças. Foi um tal de inventar brincadeiras, procurar dicas na internet e trocar experiências com outras famílias que só vendo, o que tornou os dias bem ocupados para todos. A maioria das crianças respondeu positivamente, e o fato animou as famílias.
Mas os dias foram passando: uma semana, duas, trancados em casa, e o que parecia estar funcionando até então deixa de ter tanta eficácia. Hoje, é mais frequente ver crianças cansadas, irritadas e entediadas com tantas brincadeiras e pais sem criatividade para buscar estratégias diferentes e já com pouca paciência. Foi só então que se tornaram evidentes as emoções que crianças e adultos estão experimentando. Medo, ansiedade, angústia e, principalmente, insegurança e tensão. Talvez esse tenha sido o motivo principal de tentar ocupar corpo e mente de todos: evitar o enfrentamento de nossos sentimentos. Bem, agora precisamos lidar com tudo isso da melhor forma. 
Com crianças menores, não adianta muito tecer esclarecimentos racionais para tentar convencê-los a se aquietarem. Funciona bem mais buscar o plano simbólico, bem trabalhado nos contos de fadas. Ao ouvir essas histórias, a criança se defronta com mundos imaginários repletos de problemas e conflitos e, ao mesmo tempo, vislumbra diferentes soluções encontradas pelos personagens. Desse modo, ela pode aquietar algumas de suas emoções. 
Deixar as crianças um pouco sozinhas ajuda muito. Afinal, muitas delas podem estar exaustas com tantas atividades, mesmo sem saber disso. Claro que, inicialmente, elas podem reclamar, mas, aos poucos e com o acolhimento amoroso e a colaboração dos pais, podem vir a conseguir estar com elas mesmas por alguns períodos do dia, mesmo que curtos. Para preparar as crianças para esses períodos de maior tranquilidade, meditação e ioga ajudam bastante. Na internet há orientações para conduzir as crianças nessas práticas. Você encontra boas dicas em infanciazen.com.br/videos.
E os adolescentes, como estão nesse período de isolamento? Precisamos entender que essa situação os colocou de volta ao passado. O que significa estar sob a responsabilidade dos pais 24 horas. Não é à toa que os comportamentos deles reflitam o descontentamento de serem obrigados a viver nessa situação. E como eles são diferentes entre si e diferentes deles mesmos a cada dia, as reações são variáveis. Alguns se isolaram no quarto ou na internet para se afastar da família, outros entristeceram fortemente, outros insistem que irão sair de qualquer maneira, e outros, ainda, buscam aqueles idiotas desafios na internet. E é bom que pais saibam que já existem desafios perigosos rolando por aí.
Para ajudar o jovem nesse momento, podemos, por exemplo, procurar maneiras que permitam que ele se sinta útil à sociedade. Uma rápida busca na internet permite encontrar as mais diversas campanhas que precisam de voluntários virtuais. Que tal essa dica? Ajuda, inclusive, o jovem a se perceber como participante de uma sociedade.
Não está fácil para nós, adultos, lidar com nossas questões e as deles também. Por isso, amorosidade, generosidade, compaixão e sensibilidade para se colocar no lugar do outro são fundamentais. Vamos com coragem e firmeza, minha gente! E sem culpas, por favor. É a primeira vez de todo mundo, afinal. 

Rosely Sayão, O Estado de S.Paulo
05 de abril de 2020 | 05h00

terça-feira, 24 de março de 2020

Como o coronavírus se compara com a gripe? Os números dizem que ele é pior


EL PAÍS

Há vários dias, a comparação entre o coronavírus e a gripe comum tem aparecido para minimizar a importância do novo vírus. É um argumento frágil por dois motivos. Primeiro, que a lógica funciona melhor ao contrário: o fato de a gripe ser um problema de saúde é, justamente, uma razão para nos preocuparmos com o coronavírus, pois não queremos outro problema igual. O segundo motivo é ainda pior: os dados da Covid-19 conhecidos até agora indicam se tratar de uma doença mais contagiosa e mais letal que a gripe sazonal.




O coronavírus se espalha mais. O número reprodutivo da gripe comum é 1,3, o que significa que cada pessoa infectada passa a doença a 1,3 pessoa, em média. Esse número é o que se usa para medir o potencial da epidemia. Quando é superior a um, a doença tende a se espalhar. Foi o que aconteceu em 2009 com a pandemia de gripe H1N1, que tinha um número reprodutivo de 1,5 e não pôde ser contida. Atualmente, esse vírus é um dos quatro que causam a gripe comum. Os estudos disponíveis indicam que o número reprodutivo do coronavírus está entre 2 e 3. Ou seja, que, se não forem tomadas medidas especiais, a Covid-19 infectará mais gente que a gripe.
O gráfico mostra o ritmo de infecções pelo coronavírus em comparação ao H1N1 de 2009 e ao broto da síndrome respiratória aguda grave (SARS) de 2003. Os contágios por coronavírus cresceram muito mais depressa que a gripe H1N1 em seus primeiros 30 dias. Isso explica por que alguns especialistas acreditam que o vírus não poderá ser contido, e por que a Organização Mundial da Saúde (OMS) menciona um risco de pandemia (epidemia global).


O novo vírus parece capaz de infectar milhões de pessoas. A gripe comum, com seu número reprodutivo de 1,3, causou no ano passado entre 20 e 30 milhões de doentes nos EUA, segundo os Centros de Prevenção e Controle de Doenças (CDC), o que significa 7% da população norte-americana. Na Espanha, contando apenas casos leves que chegam aos prontos-socorros, o sistema de vigilância da gripe estima meio milhão de contágios. Seu crescimento tem potencial para ser rapidíssimo. Se partirmos de 20 doentes de cada doença e assumirmos um ciclo de contágios de sete dias, após 12 semanas haveria 466 infectados pela gripe comum e mais de 30.000 pelo coronavírus CoV-19
O coronavírus também parece ser mais letal que a gripe. Em Wuhan, cidade chinesa que foi o primeiro epicentro da epidemia, 2% dos doentes detectados morreram, e fora de lá a cifra se aproxima de 0,7%, segundo a OMS. São taxas entre 3 e 20 vezes maiores que a da mortalidade da gripe comum (0,13%) e da gripe H1N1 (0,2%).
O gráfico representa a taxa de letalidade até agora. O surto de coronavírus está sendo pior que o H1N1 em 2009: naquela ocasião, houve 300 mortos associadas aos 77.000 primeiros casos (0,4%), mas com as mesmas infecções o coronavírus está associado a 2.200 mortes (2,8%). Isso é sete vezes mais.


É importante salientar que provavelmente essas cifras de letalidade acabarão diminuindo. A razão é que pode haver muitos casos de doentes não detectados – pessoas que têm sintomas leves e não vão ao médico. Assim, a contagem do número de mortes sobre o total real de casos resultaria numa menor mortalidade do vírus. É um efeito que já ocorreu com o H1N1: no gráfico, pode-se ver que sua mortalidade no começo era de 0,4%, ao passo que atualmente é estimada em 0,1% a 0,2%. Uma possibilidade é que houvesse até três vezes mais casos do que foram registrados.
Os dados da Coreia do Sul apontam nesta direção. O país está monitorando os casos de forma minuciosa, e neste momento relata uma mortalidade de 0,6% – 26 mortes em 4.335 casos detectados, após exames em dezenas de milhares de pessoas.
Essas são boas notícias, mas só relativamente: mesmo que a mortalidade do coronavírus fosse um terço do que dizem os dados atuais, continuaria sendo bem pior que a gripe comum. O epidemiologista Christopher Fraser, da Universidade de Oxford, explicou que a proporção de casos não notificados poderia ser de 50%, por isso “a taxa de letalidade rondaria 1%”. “Mesmo que haja dois ou três casos leves para cada caso confirmado, a severidade [do coronavírus] continuaria sendo muito alta. Só se existirem 10 ou 100 casos leves por cada detectado essa situação mudaria do ponto de vista da saúde pública, e isso é improvável”, ressalta. Neste aspecto, porém, não existe consenso. O virologista Adolfo García-Sastre, pesquisador do Hospital Mount Sinai, de Nova York, estima que “haja de 5 a 10 vezes mais infectados do que se estão contabilizando atualmente, o que reduz muito sua letalidade”, ressalta.
Outro problema é a falta de imunidade. García-Sastre explica que mesmo com 0,1% de letalidade este novo vírus pode ser problemático se o número total de infectados superar expressivamente o de uma gripe comum. “Ao contrário da gripe sazonal, em que há um número de pessoas que não são infectáveis porque terem imunidade, ninguém tem imunidade contra este vírus, então ele vai infectar muito mais gente que a gripe sazonal, e por isso, mesmo se tiver a mesma letalidade que a gripe, o número absoluto de casos será muito maior, e isso representará um desafio ao sistema hospitalar. Acredito que este coronavírus não chegará a ser como o vírus da gripe de 1918, mas sim como o vírus pandêmico H2N2 de 1957”, explica o pesquisador.
É uma comparação para estar alerta. Um estudo de 2016 calculou que haveria 2,7 milhões de mortes se um vírus como o H2N2 surgisse em 2005, um valor intermediário entre as 400.000 mortes atribuíveis à gripe H1N1 de 2009 e a “devastadora” gripe de 1918, erroneamente conhecida como Gripe Espanhola, que ceifou mais de 60 milhões de vidas no mundo todo.
É provável que as infecções comecem a diminuir com a chegada da primavera e o aumento das temperaturas no Hemisfério Norte. “Como o vírus da gripe, os coronavírus são vírus com envoltório, o que os torna sensíveis a condições ambientais, como as temperaturas altas, o ressecamento e a luz do sol”, explica Isabel Solá, especialista em vírus de RNA do Centro Nacional de Biotecnologia da Espanha. “Portanto, quando o calor chegar o previsível é que os vírus que saiam nas secreções de uma pessoa e caiam em superfícies externas se inativem antes, o que reduziria a transmissão”, detalha.
O médico infectologista Oriol Mitjà, do Hospital Germans Trias i Pujol, de Badalona (Catalunha), observa que “o coronavírus ficará como um vírus sazonal, de maneira que no verão haverá uma transmissão muito reduzida. O contágio é através de gotas respiratórias que caem no ambiente. O vírus sobrevive 28 dias na gota se a temperatura for inferior a 10 graus, mas só suporta um dia quando faz mais de 30 graus”, explica Mitjà, para quem baixar a guarda agora seria muito perigoso. “No momento em que as temperaturas caírem de novo o vírus voltará. Por isso é importante desenvolver vacinas e tratamentos que possamos usar nos anos vindouros”, ressalta.
O último motivo para não desprezar o novo vírus é a simples precaução. O coronavírus pode, de fato, acabar sendo um vírus com o qual vamos conviver, a exemplo da gripe. Mas por enquanto é novo e desconhecido, e só isso já seria motivo para ficar em alerta.

FONTE: https://brasil.elpais.com/ciencia/2020-03-03/como-o-coronavirus-se-compara-com-a-gripe-os-numeros-dizem-que-ele-e-pior.html

domingo, 22 de março de 2020

Escolhas bem informadas

Todo santo dia fazemos inúmeras escolhas. Algumas delas são corriqueiras e, à primeira vista, parecem simples: qual vestimenta usar, qual trajeto escolher para o trabalho ou para levar os filhos à escola, o que preparar para o almoço, qual atitude tomar com os filhos, etc. Mesmo simples, elas nos sobrecarregam e podem provocar conflitos internos, frustração, descontentamento e irritação. E se o clima mudou repentinamente e a roupa escolhida não foi adequada? E se o trajeto que tomei estava muito congestionado? E se a medida tomada com o filho não funcionou?
Outras escolhas que precisamos fazer, que não são cotidianas mas podem alterar completamente a vida familiar, exigem maiores reflexões, considerações e bom senso, isso sem falar que todos os integrantes da família precisam ser considerados. E, claro, nos oneram muito mais também porque exigem renúncias. Mudar de emprego, ou não? Como conduzir a vida profissional? Permitir que o filho adolescente viaje sem a companhia de adultos? 
Nesses casos, o melhor seria que pudéssemos fazer a escolha ideal. Ah! Ela é impossível! Então, a saída, nesses casos, é fazer a melhor escolha possível, considerando-se principalmente o contexto, as possibilidades e a realidade da vida familiar no momento.
E há também algumas escolhas que precisamos fazer que dependem do conhecimento acumulado e construído na sociedade. Investir o dinheiro guardado em imóveis ou aplicar? Aceitar a orientação de tratamento de um médico ou, quando possível, solicitar uma segunda opinião profissional? Esses são apenas dois exemplos que podem mostrar a importância de se fazer uma escolha bem informada.
Pois agora, em plena pandemia de coronavírus, é importante – por nosso bem, pelo cuidado com toda a família, para ensinarmos aos filhos e pelo apreço à comunidade em que vivemos – fazermos as melhores escolhas e as escolhas bem informadas. Elas precisam estar combinadas para que resultem em boas atitudes, não é? Comecemos com as escolhas bem informadas: para que elas possam ser tomadas, é necessário que busquemos as informações científicas, e as respeitemos. Tenho visto muita gente, com grau universitário, espalhar notícias como se fossem científicas, mas que não são, a respeito das precauções em relação à infecção.
Vou dar um exemplo. A notícia que foi espalhada afirmava que fazer gargarejo com vinagre e sal diminuiria o impacto do vírus no organismo. Para refutar essa falsa informação, basta pensar: se fosse fácil assim, por que tantos países têm apresentado enormes dificuldades em controlar a infecção pelo vírus? Depois disso, bastaria procurar na internet sites e páginas de profissionais das ciências que já desmentiram essa notícia falsa. Mesmo assim, ela continua a ser divulgada...
Ensine aos seus filhos o valor do conhecimento científico e a importância de ele ser considerado para que eles aprendam a fazer escolhas bem informadas, mesmo que esse aprendizado demore a acontecer, já que a educação é um processo que não depende apenas de informações.
Em relação às precauções para diminuir a velocidade e a quantidade de pessoas infectadas pelo vírus ao mesmo tempo, uma delas trata do distanciamento e/ou isolamento social. Nem todos podem ficar em casa, não é verdade? Nos casos em que essa opção não existe, dá para fazer as melhores escolhas: evitar saídas sem necessidade imediata, manter as mãos afastadas das principais portas de entrada do vírus – boca, nariz, olhos –, não emprestar nem tomar emprestado objetos de outros e lavar sempre as mãos.
E atenção com os filhos: nunca cobramos deles essas atitudes, por isso teremos de ter o que chamo de os três P: Paciência, Persistência e Perseverança no processo desses ensinamentos. 

domingo, 9 de fevereiro de 2020

São as histórias que nos ajudam a olhar o mundo, a ver e entender melhor a vida como ela é

Para crianças, é uma oportunidade incrível a de ouvir histórias, tanto em casa quanto na escola, e aprender com elas. Você, certamente, já teve a chance de contar histórias para seu filho ou alunos. Temos esse costume principalmente quando são pequenos. Mas, aos poucos, vamos perdendo a paciência e deixando de lado essa atividade, que é tão prazerosa para a crianças e para os pais também!
Antes de a criança ter aprendido a ler nossas letras e saber o significado de muitas palavras, ela consegue absorver a narrativa da história que ouve. E essas histórias falam diretamente ao coração: ela lê imagens no livro, a postura dos pais, a sonoridade de sua voz e emoções que eles imprimem à história. Ela se identifica, positiva ou negativamente com personagens, e vive intensamente muitas das experiências que eles transmitem. Como alguém já disse, ler é viajar sem sair do lugar, viagem essa que não é apenas para conhecer lugares, mas também – e principalmente – para se conhecer e aos outros.
Se você tiver a oportunidade de observar uma criança – ou um grupo delas – ouvindo alguém contar uma história, você vai ver, nas expressões faciais dela e na linguagem corporal, o universo de emoções que a assaltam. 
Não é preciso ter um objetivo para contar uma história para a criança por um motivo simples: ela sempre vai superar qualquer objetivo que tenhamos colocado porque irá muito além deles. Há pais e professores que escolhem temas que acreditam ser importantes para a criança naquele momento. Pois saiba que ela é capaz de encontrar tela, nas palavras ou narrativas, para pintar nelas o que precisa no momento. Desse modo, não precisamos ler histórias sobre morte ou evitá-las, por exemplo, quando a criança passa por uma perda familiar ou de um animal de estimação.
A leitura de histórias para crianças é tão importante que astronautas na Estação Espacial Internacional encontram um tempo para ler livros para as crianças (veja em storytimefromspace.com). Imagine o valor dado pela criança à leitura ao saber que astronautas dedicam tempo para ler para ela.
Precisamos valorizar o ato de contar histórias aos mais novos e, aos poucos, estimular também que eles nos contem as suas. Podem ser histórias inventadas, sobre o dia que passou ou mesmo aquelas que vivem apenas dentro de cada um de nós. O que importa é que aprendam a tecer narrativas. Ouvir e contar histórias é o primeiro passo para dar à criança e ao jovem a vontade de ler. Nós, brasileiros, lemos pouco – em média, 2,43 livros por ano. Esse fato empobrece a leitura que fazemos do mundo!
Se a criança pequena adora ouvir histórias, certamente tem potencial para gostar de ler. Mas não sabemos como colocar esse prazer em ato; ao contrário, muitas vezes desestimulamos a leitura. O modo como muitas escolas tratam o livro e a leitura com seus alunos é um exemplo. Vamos, como astronautas, buscar encantar os mais novos pela leitura. É possível! E nem precisamos estar na estação espacial. Basta iniciarmos a narrativa com uma frase mágica que, na infância, é: “Era uma vez...”.