sábado, 15 de dezembro de 2018

CINCO TÓPICOS SOBRE MUDANÇA

(...) O primeiro seria a necessidade de abandonarmos o paradigma motivacional na comunicação corporativa (na educação também, mas deixemos isso para outro momento).
A necessidade de motivar as pessoas o tempo todo nasce da própria estrutura produtiva burguesa: acreditar na mudança significaria melhor produtividade, mais otimismo, menos tristeza, mais riqueza.
O capitalismo precisa de pessoas felizes e que creem nos avanços. O problema é que apenas os doentes conseguem ser felizes "o tempo todo".
O problema é que o paradigma motivacional implica debilidade cognitiva, intelectual e afetiva, quando usado em demasia, como é o caso em questão.
Seres humanos podem não saber o tempo todo o que é fake news ou verdade, mas, quando mentimos demais para eles, eles chegam a um momento em que são obrigados ou a entrar em crise (justamente o que o paradigma motivacional teme e reprime com todas as forças) ou a aceitarem que optaram pelo retardo mental (o que em si, nalgum momento posterior, poderá gerar alguma forma de crise).
Os seguintes tópicos devem ser vistos à luz deste primeiro como fundamento.
Um segundo tópico é a imposição da felicidade o tempo todo, o que, por sua vez, implica um aumento de medicamentação. A mentira indiscriminada como paradigma é, seguramente, patogênica. A solução é se dopar em alguma medida.
O contrário aqui não é a "felicidade da verdade", mas o vínculo delicado entre verdade e saúde mental, de alguma forma. Seja nos jovens e no seu aumento de uso de ansiolíticos, seja nos mais velhos e na sua depressão. A destruição da libido parece ser uma escolha política para garantir um mundo mais seguro e correto.
Aliás, um terceiro tópico de mudança que nos desafia é a crescente diminuição da atividade sexual entre os mais jovens. A escolha pelo combate à ansiedade implica uma diminuição da própria libido, uma vez que ansiedade e libido são irmãs. Trocando em miúdos: se você não quiser ser brocha, terá que ser um pouco infeliz.
Um quarto tópico, decorrente dos anteriores, é o caráter redentor do uso de um pouco de verdade na comunicação com as pessoas. Dizem a elas, por exemplo, que os algoritmos as conhecem melhor do que elas mesmas e que, como gosta de falar o historiador israelense Yuval Harari, de forma um pouco dramática, logo seremos hackeados por esses mesmos algoritmos, que nos dirão o que queremos e o que pensamos, por meio das mídias sociais crescentes.
Esse discurso pode ser mais importante do que ficar repetindo milhares de vezes que as mídias sociais têm um caráter democrático e revolucionário e que o avanço da inteligência artificial criará um mundo de renda mínima para as pessoas ou que elas criarão obras como as de Shakespeare a cada manhã.
Sem trabalho não há dignidade, e adultos que se acostumam a viver "de graça" sempre têm problema de caráter. O hackeamento a que se refere Harari nasceria do uso de algoritmos mapeando nossos perfis de consumo e de postagens.
Um quinto tópico é o crescimento inexorável da solidão no mundo. O tédio será um dos afetos essenciais num "mundo Netflix  + iFood" como paradigma cotidiano. As pessoas viverão mais e terão menos família a sua volta. As pessoas estarão ocupadas sendo felizes e não cuidando de idosos. Empresas oferecerão serviços no lugar dos "afetos antigos". E a solidão será um problema de saúde pública, fruto da ampliação da saúde em larga escala.
Luiz Felipe Pondé

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