segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

LIÇÕES DE 2016 (TEXTO ADAPTADO)

Aprendi que golpes de estado podem ser executados sem tanques na rua desde que haja uma perfeita comunhão entre mídia, legislativo, executivo e judiciário. Aprendi que tudo é de fato luta de classes, e que a única Liberdade que não podem nos tirar é escolher que atitude teremos diante de cada acontecimento. Aprendi a esperar calmamente que a fila ande sem vociferar contra os mais lentos ou contra o sistema; aliás aprendi a não culpar nem Estado, nem família, nem amigos, nem chefe, nem o acaso, nem coisa nenhuma pelos fracassos da vida. Aprendi a meditar e aprendi que deixar de ver um obstáculo na estrada faz sim uma dúzia de ovos quebrar. Aprendi a tocar bois e aprendi que alguns deles, quando mal tocados, correm na direção oposta: a sua. Aprendi que amizades virtuais podem se tornar reais e adquirir a capacidade de seguir por uma vida. Aprendi que, como escreveu Alan Cohen, a dor é uma pedra no caminho e não um lugar para acampar. Aprendi que átomos têm 99,9% de espaço vazio e que, sendo feito de átomos, o ser humano é, portanto, feito de espaço vazio. Aprendi a passar algumas horas do dia buscando alcançar o silêncio que só o vazio oferece. Aprendi que antes de algumas das mais belas e significativas revelações tudo o que existe é terror e desespero. Aprendi, aliás, que não há besteiras irreversíveis e que a vida tem sim um botão de “undo”, mas que para alcançá-lo é preciso dominar a mais difícil das artes: a de perdoar. Aprendi que estamos sendo constantemente vigiados pela tirania privada-estatal e que um mundo dominado por corporações é um mundo sem alma, sem vida e sem sentido. Aprendi que toda a forma de autoridade deve ser questionada e precisa se provar legítima. Aprendi que não tendo a capacidade de se provar legítima ela precisa ser destruída. Aprendi que nenhum direito civil jamais foi concedido sem luta e sem dor, e que a quem a vida ofereceu enormes privilégios cabe lutar pelos menos privilegiados. Aprendi que a maior das violências é deixar de reconhecer a humanidade no outro e que estamos caminhando para nos aprofundar em uma ditadura de classes que se impõe não só pela força do porrete mas também pela violência institucional e constitucional. Aprendi que se tratamos um ser humano como bicho ele se comporta como bicho; mas que se tratamos um ser humano com amor e compaixão ele se comporta como um Deus. Aprendi, ou reaprendi graças a nossos irmãos colombianos, que o futebol pode sim nos elevar a um lugar de mais significado. Aprendi, no mais literal dos sentidos, que quando tudo o que temos é um martelo só conseguimos ver pregos ao redor. Aprendi que existe uma paz dentro de cada um de nós que vai além de toda a compreensão e que, como pediu a anarquista Rosa Luxemburgo, é preciso não fugir da luta em nome de um mundo dentro do qual sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres.

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